Celebra a amizade e o valor da palavra

Celebra a amizade e o valor da palavra

 

Mirian Paglia Costa (1)

Celebrante das diversas manifestações da alegria e do brincar em suas obras (Os bastidores do Carnaval, O país do futebol, E o que é o amor?), Betty Milan agora expõe Ana, personagem e narradora de seu novo romance – O clarão – à iminência da perda do amigo querido, João, que enfrenta a proximidade da morte.

Betty Milan aborda com coragem e sensibilidade aquele que é considerado um mau tema. Porém, fiel à sua trajetória, transforma o trabalho de luto da personagem em caminho para “o clarão” (daí o título): a descoberta de que a consciência da morte infunde novo valor à vida. “A morte é uma estrela invisível”, percebe Ana, que sai ressuscitada de sua perplexidade, disposta a não mais desperdiçar a existência. E por que o amigo? Porque, ao pedir que Ana o visite antes do fim, João abre um abismo que ela só pode transpor ou transpor. E esta é mais uma – a última – lição do amigo, para proteger Ana e reascender nela o amor à vida.

Embora impregnado de alusões e sugestões poéticas – a solitária Ana dialoga com uma libélula, por exemplo –, quase tudo em O clarão é factual. O livro poderia ser um registro de fatos reais: a começar do amigo, que é inspirado no publicitário Carlito Maia. Há cenas do cotidiano, uma carreira no teatro, um marido, um filho, outras amizades. E duas festas: um Ano Novo carioca, abrindo o livro, e um Carnaval paulistano, encerrando-o. Ambas estão associadas à passagem do milênio – fim e recomeço, portanto, a confirmar em mais um nível, agora o do tempo do romance, a trama sutil que Betty teceu para narrar o quase impossível: uma relação igualitária e sem sexo entre um homem e uma mulher.

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1. Mirian Paglia Costa é jornalista, editora e poeta, autora de Colar de maravilhas e Notícias do lugar comum. Texto do press-release para lançamento do livro, abril, 2001.